Por: Giordano Cimadon
Qual a relevância da religião nos dias atuais? Esta é uma pergunta que ressurge de tempos em tempos. Nas últimas décadas, enquanto a ciência e a tecnologia vêm avançando, as religiões parecem às vezes perder fôlego, deixando de ser atrativas, interessantes, especialmente para os mais jovens. Tendo como base a busca pela liberdade civil e o aumento dos conhecimentos a respeito da física, da química, e de outros campos do saber humano, muitos chegaram a afirmar que a religião estava condenada ao desaparecimento.
Contudo, o que se verifica na atualidade é que em grande parte do mundo houve uma verdadeira explosão de fé religiosa. O mundo está se tornando mais moderno, mas isso não significa que ele
esteja se tornando menos religioso. Sem ignorar o mal que muitas pessoas e governos fazem em nome da religião (ou em nome da erradicação da mesma), é possível afirmar que a religião
continua sendo tão relevante agora como sempre foi, porque corresponde a um anseio profundo do ser humano de fazer parte de algo maior do que si mesmo.
Religião é uma palavra que vem do latim religare, e que significa “voltar a ligar”. Portanto, a chave para compreender o sentido da religião e o motivo pelo qual a religião e a religiosidade continuam sendo tão importantes para os seres humanos em todas as partes do mundo, está em saber do que foi que nos desligamos, ou seja, com que devemos voltar a nos ligar? O propósito da religião é que voltemos a nos ligar com Deus. Mas é aí que surge um grande problema. Quem é Deus? O que é Deus? Cada forma religiosa – cristã, budista, hinduísta, xamânica, espiritualista, gnóstica, entre outras – possui sua própria visão do que ou de quem seja Deus.
Entretanto, ainda que as representações de Deus sejam diferentes de religião para religião, é certo que todas elas (Deus, Deuses ou Deusa, com forma humana ou animal, forças naturais ou
cósmicas), referem-se a poderes que estão além de nós mesmos. Todas as religiões falam de Deus à sua maneira, mas em todas elas Deus é a representação de algo que está mais além de nós; são forças ou poderes que o gênio humano não controla, e que a razão ordinária não compreende. Dessa forma, a religião é um voltar a ligar-se com algo que está mais além de nós mesmos, algo que nos supera, que nos antecede, que nos transcende, ou seja, algo que está mais além dos limites de nós mesmos, da percepção que temos sobre quem nós somos.
Esta percepção que temos de quem somos é o que podemos chamar de ego, palavra latina que significa Eu. Eu mesmo. Mim mesmo. O ego é o que nos faz perceber – equivocadamente – que
estamos separados dos outros, que o mundo gira em torno de nós, que a nossa felicidade deve vir antes da felicidade dos outros, que as demandas imediatistas por satisfações e prazeres
sensoriais são mais importantes do que as conexões profundas e significativas que podemos fazer com outros seres – humanos ou não -, com a natureza e com tudo o que parece ser insondável
para nossa razão.
Nas sociedades modernas, cada vez mais as pessoas são estimuladas pelas facilidades tecnológicas e os avanços científicos a se tornarem cada vez mais “ensimesmadas”, mais
voltadas para si mesmas, para seus próprios interesses e necessidades, em detrimento dos interesses coletivos e das necessidades alheias. Ficamos isolados em uma ampla bolha de informações superficiais que apenas refletem narcisicamente os nossos próprios interesses e anseios. E com isso perdemos a nossa sensibilidade humana, a capacidade de conhecer o outro, ajudá-lo e crescer com ele.
Aqui é onde a religião cumpre uma função extraordinária. Com seus rituais, orações, observações litúrgicas, atos de caridade, a religião nos educa na função da transcendência, quer dizer,
ajuda-nos a irmos mais além de nós mesmos, seja em direção à Deus ou em direção a outros seres humanos. Não importa qual seja a sua religião. Ela o ajudará a ir mais além de si mesmo, a
sentir-se parte de uma realidade mais significativa, e se for vivida como pretendido, será de grande valia para que se possa desenvolver amor, compaixão, sabedoria, confiança, esperança, e
tantos outros valores que estão cada vez mais escassos em nossos tempos modernos.